O valor das causas administrativas e a sua determinação vem previsto nos artigos 31º a 34º CPTA.
Nos termos do art.31º/1 “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
O valor da causa é relevante para saber se cabe recurso da sentença proferida em 1ª instância e qual o tipo de recurso como podemos retirar do art.31º/2 CPTA.
Retiramos ainda do art.31º/4 CPTA que no que toca aos poderes das partes e à intervenção do juiz na fixação do valor da causa é aplicável a lei processual, ou seja, os artigos 296º a 310º CPC.
Destas normas retiramos que a fixação do valor da causa visa prosseguir finalidades de ordem pública relacionadas com a organização e funcionamento dos tribunais.
O ponto que nos releva aqui analisar vem contido no artigo 34º CPTA e no seu critério de determinação supletivo: nos casos que encaixem no seu nº1 é atribuído ao valor da causa o previsto no seu nº2 – um valor superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo (cujo valor é 30.000€, logo 30.000,01€).
Tentaremos responder à questão de se este critério supletivo é verdadeiramente necessário e em que situações deverá ser aplicado, apresentando ainda uma interpretação restritiva que procura limitar a sua aplicação ao menos número de casos possível.
Para esta análise iremos socorrer-nos de dois acórdãos de Tribunais Centrais Administrativos, acórdãos estes em que, de modos distintos, uma das partes alega a indeterminabilidade do valor da causa de modo a apresentar como valor os 30.000,01€, sendo os Tribunais obrigados a restringir este conceito.
Acórdão Tribunal Central Administrativo Central Sul de 01/10/2015:
Neste acórdão uma das partes alega que o valor da causa é indeterminável pois o objeto está conectado com bens e interesses pessoais.
O Tribunal para esta averiguação faz uma análise total aos artigos 32º a 34º CPTA.
Primeiramente caberá aferir se o processo é relativo a bens imateriais ou a normas emitidas ou omitidas no exercício da atividade administrativa, sendo que se tal não for o caso não será premente a aplicação do 34º e teremos que verificar de o caso se reconduz a alguma das situações especiais especificadas no 33º CPTA. Caso isto também não se verifique teremos que ponderar os critérios gerais do artigo 32º CPTA.
No caso em apreço dos pedidos formulados resulta que, no presente processo, relativo a atos administrativos reputados de ilegais pelo Autor (atos que lhe reduziram a pensão de aposentação e o subsídio de compensação), a utilidade imediata do processo para o Autor é claramente pecuniária: reaver os montantes que lhe foram reduzidos na pensão mensal e no subsídio mensal de compensação que primitivamente lhe tinham sido atribuídos.
Para o Prof. Mário Aroso de Almeida, o artigo 34º/1 só deverá ser aplicado no caso de processos respeitantes a bens imateriais de valor indeterminável, ou seja, sem valor pecuniário, “que se destinem à declaração ou efetivação de um direito extrapatrimonial”.
Neste caso temos um aparente exemplo de uma ação com valor não determinado (declaração de ilegalidade de atos administrativos) da qual, através de um processo de inferência lógica, podemos retirar o valor pecuniário à qual deve estar associado.
Acórdão Tribunal Central Administrativo Central Norte de 14/02/2007:
Há novamente uma discussão em torno do significado do conceito de situações administrativas relativas a “bens imateriais” previstas no artigo 34º/1 CPTA e por isso consideradas de “valor indeterminado”. O caso em apreço consiste num pedido de anulação de uma decisão administrativa decorrente de um concurso público e consequente contratação dos serviços da parte.
Para a restrição deste conceito o Tribunal especifica em que é que deve consistir este “valor indeterminado” através de exemplos da doutrina, tais como “previsões de autorização ou proibição de manifestações”; ”encerramento de estradas”; “admissão num curso universitário ou nos cadernos eleitorais”; e mais.
Exemplifica ainda outros casos que deverão ser englobados no artigo 34º/1 CPTA por serem de “muito complexa determinação”, casos estes como “restrições ou inibições de atividades profissionais livres”; “lucros cessantes de valor indeterminável”; “perda de clientela”; e mais.
É no tocante a estes últimos casos que temos reservas de a aplicação do artigo 34º CPTA ser a melhor solução. O próprio artigo 31º/1 CPTA expressa o princípio da utilidade económica, ou seja, que deverá haver alguma conexão entre o valor da causa e a sua utilidade económica de modo a que este seja facilmente averiguada. Atribuir um valor fixo a um conjunto de causas é um grande atraso para esta utilidade económica, sendo que todas terão um valor que não espelha minimamente esta, mas antes foi estabelecido de modo rígido.
Em casos de valor verdadeiramente indeterminado e indeterminável (como os primeiramente apresentados pelo Tribunal Central Administrativo do Norte) não creio que pudesse haver uma muito melhor alternativa: contudo para isto ocorrer deverá haver uma impossibilidade total da existência de um cálculo segundo juízos de equidade tendo em conta um conjunto de critérios (como vem previsto nos artigos 306º e 308º CPC).
O artigo 34º CPTA reporta-se a processos respeitantes a “normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, incluindo planos urbanísticos e de ordenamento de território: visa assim os processos de impugnação de normas e não de atos administrativos de modo direto.
Deste modo propomos uma interpretação restritiva do artigo 34º/1 CPTA de modo a passar-se a ler “Consideram-se de valor indeterminável os processos respeitantes a bens imateriais e a normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, incluindo planos urbanísticos e de ordenamento de território, quando estes tenham valor indeterminado e indeterminável segundo juízos de equidade e motivações das partes.”
A verdade é que como retiramos doa artigos 306º e 308º CPC, nos pedidos ilíquidos sem expressão pecuniária certa e única é necessário atender à causa de pedir apresentada na petição inicial que indiciará, nos seus termos concretos, a noção de utilidade económica da pretensão.
Este cálculo, nos casos em que é possível, deverá ter em contra a equidade, as motivações da impugnação e ainda as consequências caso esta transite em julgado ou não.
Por exemplo, pegando num caso atual com alterações por motivos de utilidade.
Imaginemos que era emitida uma norma administrativa que limitava o consumo nos restaurantes durante as noites de fim-de-semana. Esta norma iria prejudicar os restaurantes de um modo extremo e óbvio.
Imaginemos que o dono de um restaurante, A, decidia impugnar esta norma com base num conjunto de normas que ditassem a sua ilegalidade.
Abstraindo-nos de qualquer valoração de mérito ou substância, este caso iria ter um valor de causa enquadrável no artigo 34º/1 CPTA e, por este motivo, reconduzível ao nº2: 30.000,01€. Contudo é nos perfeitamente possível retirar qual o verdadeiro valor da causa que nos poderá traduzir a sua verdadeira utilidade económico-jurídica nos termos do artigo 31º/1 CPTA através do conjunto de critérios já mencionado: A pretende com esta impugnação um valor pecuniário, que é toda a receita que irá perder durante o pendor desta norma (lucros cessantes) que embora indeterminado não é indeterminável (com uma estimativa de receita comum naquele conjunto de dias possivelmente arredondada por baixo).
Deste modo concluímos por dizer que cremos que esta interpretação restritiva irá fazer mais justiça às verdadeiras funcionalidades do valor da causa.
Rita Albuquerque Santos, nº 58402 TA07
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